Film Noir - o Tópico

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Samwise
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Re: Film Noir - o Tópico

Post by Samwise »

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The Big Heat é à superfície um filme com poucas "shades of grey" entre o Preto e Branco, entre os "bons" (ou o bom, que se resume inicialmente a um polícia/detective, Dave Bannion, interpretado por Glenn Ford) e os "maus", em que a linha separadora entre a lei e o crime está claramente definida. Essa linha é a corrupção a que todo um departamento policial está sujeito por força de um gangster, Lagana (Alexander Scourby), um "Crime Lord" de colarinho branco que para além de ter a polícia no bolso domina toda a cidade à conta de violência e intimidação. Todos se vergam perante Lagana - todos, à excepção de Bannion, que a cada novo dia aguenta menos as pressões e imposições dos seus superiores para que feche os olhos sobre certas investigações.

Assiste-se a uma escalada de violência até ao momento em que Bannion vê o seu eixo familiar ser "atropelado" pelo profissional. Ainda que por erro - a bomba que foi colocada no carro era si - Bannion assiste à morte da mulher enquanto está pôr a filha a dormir. A partir desse instante, e sem se deixar intimidar, o polícia vai empenhar-se na destruição de Lagana, nem que para isso tenha de renunciar institucionalmente ao cargo que ocupa no departamento.

Podemos olhar para personagem de Ford como uma espécie de molde daquilo que mais tarde viriam a ser as personagens de Stanley White (Mickey Rourke ) em Year of the Dragon (1985), o polícia incorruptível que não tem medo de confrontar os chefes da máfia "olhos nos olhos", nem de cruzar a linha vermelha para atingir resultados, e Bud White (Russell Crowe) em L.A. Confidential (1997), um muscle man com mais neorónios do que os seus parceiros habituais de pancadaria, e com uma apetência particular para castigar agressores de mulheres.

E há um agressor de mulheres particularmente repelente neste filme, o braço direito de Lagana, Vince Stone, interpretado de forma superlativa por Lee Marvin - um psicopata assassino que gosta de torturar e queimar as suas vítimas. O confronto entre Bannion e Stone, duas forças brutas em rota de colisão, é um dos grandes prazeres do filme.

Outro "grande prazer" é observar de perto Debby Marsh - a "namorada" de Stone (melhor seja dito, a mulher subjugada e humilhada por Stone, que não se importa de levar aqui e ali uns tabefes desde que receba a mesada para luxos e vá mantendo o seu "estatuto" no meio), interpretada por Gloria Grahame. E se é Glenn Ford que domina fisicamente o filme à conta de uma presença imponente e indomável, cabe a Gloria Grahame o trono da componente emocional - uma posição que virá a permitir o desbloqueio de um "nó górdio" moral que é também a chave para a queda de Lagana.

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Para além da corrupção institucional, há no filme um ponto de vista mais estreito dirigido à corrupção moral a nível mais particular - o estudo comportamental dessa variável no indivíduo é uma temática cara a Fritz Lang - e neste campo Gloria Grahame é dona e senhora do território, ao pertencer-lhe o arco narrativo de transformação que coloca moralmente a salvo a personagem de Ford. Debby é um animal emocional acima de tudo (queixa-se inclusivamente de lhe "faltarem pensamentos" quando se depara subitamente com muito "tempo disponível"), mas é de forma racional que vai a certa altura tomar decisões, e agir. Paradoxalmente, é através de um crime que a personagem de Grahame limpa a sua honra (e com isso evita que Bannion suje a sua), naquilo que será um dos finais alegoricamenter mais suculentos de todo o universo noir, um final a que não falta a devida metáfora visual, a ver com manter a "face lavada" ao final do dia. E é também nesse instante que Bannion finalmente a aceita como uma das "suas", uma das "boas".

Num filme de intensidade e violência uns patamares acima da média, é interessante verificar que a personagem central, um polícia "tough as nails", tem o seu destino "controlado" por três mulheres - cada uma com um "grip" de ordem diferente na sua vida. A mais importante, e até a determinada altura, é a sua esposa (a âncora apaziguadora que tudo define), depois vem a namoradita supérflua, de mentalidade aparentemente vácua, do seu principal antagonista (Grahame), e finalmente a viúva de um capitão policial (que se suicidou por não aguentar a pressão), uma das "más da fita", alguém que esconde provas incriminatórias suficientes para tramar Lagana, e que tenta lucrar com isso. Outra componente recorrente no cinema de Lang - personagens femininas com peso e participação determinantes no enredo - pense-se por exemplo em Metropolis e em Woman in the Moon.

De uma perspectiva paralela, o confronto entre "bons" e "maus", entre pureza e podridão moral, não se resume a policias incorruptos VS criminosos, nem a Bannion VS Stone. Há um ângulo que explora esta dicotomia pela via do modelo de vida americano/ocidental, centrado na noção idealizada de família (cristã?). O filme concentra um olhar pronunciadamente favorável (até angélico) no casal Bannion, pendurando-lhe em cima tudo o que são boas condutas morais, e faz o contrário ao par Stone/Marsh, desde logo mostrando uma união malsã formada fora da instituição "casamento" (o que existe é antes um "negócio", uma "troca comercial"), e depois através de um conjunto de comportamentos morais socialmente condenáveis e impróprios (isto para lá dos actos criminosos de Stone). Dissolvido o primeiro casal por interferência criminosa, a resolução moral do enredo passa também pela dissolução provocada do segundo par, conquistando-se um dos seus elementos pela via da "correção" da sua perspectiva sobre a vida - ou seja, trazendo-a para o território do "bem" pelo seu próprio pé.

Talvez The Big Heat seja essencialmente referenciado e recordado por uma sequência em particular - das mais violentas encenadas num filme desta época - mas é obra para figurar no Olimpo do género noir, por tudo o que oferece em redor dessa sequência, e pela forma como num enredo aparentemente simples e directo insere um subtexto moral multi-camada, de alcance abrangente e fácil percepção. Tudo preto no branco - com umas zonas de cinzento pelo meio.

10/10

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Re: Film Noir - o Tópico

Post by rui sousa »

Óptima análise Sam! Os três Lang de que falaste são magníficos, mas venero o The Big Heat mais em particular. Foi um autêntico estrondo quando o vi há uns bons anos. Há muito que o quero revisitar.
Samwise
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Re: Film Noir - o Tópico

Post by Samwise »

Vi o The Big Heat já umas três ou quatro vezes, mas tenho tido o cuidado de deixar passar períodos de tempo suficientemente amplos para me esquecer de quase tudo - e poder assim redescobrir, a cada nova visualização, uma boa parte dos pormenores. Também fiz isto com os dois anteriores.
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paupau
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Re: Film Noir - o Tópico

Post by paupau »

Assim da descricão do Sam veio-me à memória o contexto da cena da bomba e é esse que torna a cena tão memorável, o inesperado da situação, ainda agora, quanto mais à época. É inusitado e não estou a ver exemplos de uma detonação numa cena assim tão idílica. Quase sempre é cena de suspense à Hitchcock, em que nós sabemos que há bomba, mas as peesonagens não.

E a cena mais violenta e famosa do filme ainda consegue ter mais uma surpresa a caminho do fim. Um noir e um filme de topo, vindo de um dos grandes mestres.

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Re: Film Noir - o Tópico

Post by Samwise »

paupau wrote: September 14th, 2020, 7:38 pm Assim da descricão do Sam veio-me à memória o contexto da cena da bomba e é esse que torna a cena tão memorável, o inesperado da situação, ainda agora, quanto mais à época. É inusitado e não estou a ver exemplos de uma detonação numa cena assim tão idílica. Quase sempre é cena de suspense à Hitchcock, em que nós sabemos que há bomba, mas as peesonagens não.
Sim, sim, verdade - aquilo cai mesmo do nada, sem avisos. Ainda é pior do que um jump-scare, porque nem há essa preparação via suspense, nem qualquer acompanhamento sonoro prévio de que algo de muito mau se vai passar.
E a cena mais violenta e famosa do filme ainda consegue ter mais uma surpresa a caminho do fim. Um noir e um filme de topo, vindo de um dos grandes mestres.
Aqui está um facto curioso. Pensando bem nas coisas, e tirando para fora do contexto todos os filmes onde vemos carros a explodir à conta de bombas, o atentado é um acto bem mais grave do que esse outro "crime surpresa" que nunca vai deixar de ser mencionado sempre que se falar deste filme. Deve haver pouca coisa pior do que veres a tua mulher morrer à bomba, com a agravante de teres um filho criança ao colo e de estares completamente saciado e feliz com a família que tens. Mas acho que estamos culturalmente anestesiados para esse tipo de atentado, de tantas bombas que já foram encenadas nos filmes. E talvez também que parte do horror da outra cena seja o aspecto sensorial de imaginares o que sentirias se fosses tu a vítima. Não vês a coisa a acontecer, mas ouves o resultado...
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paupau
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Re: Film Noir - o Tópico

Post by paupau »

Bons pontos sem dúvida, há algo de cultural aqui. Talvez se presuma que na bomba há a morte instantânea e no outro caso há sequelas físicas e psicológicas irreparáveis.
E também a satisfação da cumplicidade comna violência quando a Gloria Grahame repaga na mesma moeda. A velha questão da glorificação da violência está aqui presente.

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Re: Film Noir - o Tópico

Post by mansildv »

https://upload.wikimedia.org/wikipedia/en/7/72/Hammett_%281982_movie_-_DVD_case%29.jpg
https://en.wikipedia.org/wiki/Hammett_(film)
https://www.imdb.com/title/tt0085640/

Temos aqui o Dashiell Hammett no meio de uma história noir :-)))
Vale a pena yes-)
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Re: Film Noir - o Tópico

Post by Samwise »

mansildv wrote: September 15th, 2020, 2:04 pm Temos aqui o Dashiell Hammett no meio de uma história noir :-)))
Que coisa mais estranha... :lol:

Este não vi.
paupau wrote: September 14th, 2020, 9:31 pm E também a satisfação da cumplicidade com a violência quando a Gloria Grahame repaga na mesma moeda. A velha questão da glorificação da violência está aqui presente.
Segundo o Muller, essa parte não está no livro, e foi o argumentista que moldou o arco da personagem para permitir essa "gratificação" (ao espectador?). O que me leva à velha máxima "todos têm aquilo que merecem", e que está bem presente também no The Woman in The Window e Scarlett Street - é bom ver os filmes de seguida, porque o modo como se ligam os castigos aos respectivos crimes resulta de uma diferença contextual...
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Re: Film Noir - o Tópico

Post by mansildv »

Samwise wrote: September 15th, 2020, 2:36 pm Que coisa mais estranha... :lol:
É estranho mas interessante! Vale a pena yes-)
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Re: Film Noir - o Tópico

Post by rui sousa »

mansildv wrote: September 15th, 2020, 2:04 pm https://upload.wikimedia.org/wikipedia/en/7/72/Hammett_%281982_movie_-_DVD_case%29.jpg
https://en.wikipedia.org/wiki/Hammett_(film)
https://www.imdb.com/title/tt0085640/

Temos aqui o Dashiell Hammett no meio de uma história noir :-)))
Vale a pena yes-)
Este filme apanhou-me completamente de surpresa. Gostei muito! Mesmo com toda a estranha história de bastidores. Hoje não sabemos se é mesmo do Wenders se é do Coppola. Mas caramba, funciona tão bem assim como está. Mas isso sou eu... :-)))
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Re: Film Noir - o Tópico

Post by Samwise »

Continuo a consumir noirs um bocado à bruta (e a acrescentar mais títulos à lista todos os dias - o processo é um infernal círculo vicioso onde filmes e sugestões puxam mais filmes e sugestões - um mecanismo particulamente propício de ser alimentado pelo modelo de funcionamento "por links" de toda a Internet), como quem acende uns cigarros nos outros.

Os últimos títulos dignos de grande nota são duas obras que ainda não conhecia de um mestre cineasta francês, o Henri-Georges Clouzot! E os filmes foram o Le Corbeau (1943) e o Quai des Orfèvres (1947), realizados numa altura pré-Nouvelle Vague - não têm nada a ver com o tipo de cinema "modernista" e "experimental" ensaiado no Ascenseur pour l'Échafaud, do Malle, por exemplo, e são muito mais clássicos na estruturação narrativa, nos diálogos, e no modo como a câmara mostra a sociedade e a realidade dos acontecimentos. Por outro lado, também se afastam mais daquilo que identificamos como os arquétipos culturais do noir americano. O que não quer dizer que não sejam dois grandes filmes - fiquei agradavalemente surpreendido pela sofisticação, aprumo técnico e domínio da narrativa (o saber contar uma história - com múltiplas perspectivas e personagens).

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Ninzabo, uma sugestão para ti em particular: vê o Le Corbeau - creio que é um tipo de história que vais apreciar (e é baseado num caso real). Mas vê sem leres nada sobre a intriga - é mais giro assim

Agora vou atacar o remake, o The 13th Letter, feito pelo Otto Preminger uns anos mais tarde, e que deverá andar mais próximo dos códigos do cinema noir.
Last edited by Samwise on September 19th, 2020, 10:03 pm, edited 2 times in total.
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Re: Film Noir - o Tópico

Post by paupau »

O Le Courbeau é literalmente venenoso! Um bom retrato de mentalidades tacanhas e se bufismo que existia na Europa da época. Contudo, aplica-se a qualquer época e lugar
O Quai também gosto bastante, mas fica um pouco abaixo para mim.
Um proto noir francês (anos 30) é o Pepe le Moko, com o sempre excelente Jean Gabin.

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Post by Samwise »

paupau wrote: September 17th, 2020, 9:58 pm O Le Courbeau é literalmente venenoso! Um bom retrato de mentalidades tacanhas e se bufismo que existia na Europa da época. Contudo, aplica-se a qualquer época e lugar
O filme tem muita matéria para reflexão - em particular sobre a natureza do mal enquanto substrato social invisível, que se movimenta nas sombras e nas costas das pessoas, uma formulação particularmente nefasta de hipocrisia que constitui uma teia inescapável - porque todos, de alguma forma, a alimentam. O combustível para isso é a eterna noção de que os "defeitos" dos outros são sempre piores do que os nossos, e que esses sim têm de ser desmascarados publicamente e prontamente castigados. Há sequências encenadas de forma magnífica - a mostrarem visualmente como as "coisas fluem" - informação e comportamentos ...
O Quai também gosto bastante, mas fica um pouco abaixo para mim.


São filmes bastante diferentes - e este tem realmente características mais noir, na vertente "Murder Drama" - só que cultural e socialmente bastante diversas da sua contrapartida americana. A personagens são mesmo pitorescas, e o filme por vezes bastante "maroto", de uma maneira completamente natural.
Um proto noir francês (anos 30) é o Pepe le Moko, com o sempre excelente Jean Gabin.
Este já me persegue também há uns tempos.
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Re: Film Noir - o Tópico

Post by Samwise »

Samwise wrote: September 17th, 2020, 9:19 pm Agora vou atacar o remake, o The 13th Letter, feito pelo Otto Preminger uns anos mais tarde, e que deverá andar mais próximo dos códigos do cinema noir.
É fraquinho. Para esquecer, mesmo.

O básico da história mantém-se, as personagens são as mesmas, mas este remake relocalizado para um povoado americano fica muito aquém do original, e é dos filmes menos conseguidos do Preminger. Houve dois ou três factores que cortaram os pés a esta versão, e o principal é que o sentido comunitário desapareceu por completo, talvez porque o local onde se passa esta história parece agora muito maior, e o enredo concentra-se na meia dúzia de personagens que têm fala - sem ligação e sem o envolvimento de próximidade de todo o espaço, algo fundamental no primeiro filme (a certeza de que todos se conhecem, e de uma teia transmissora por onde a informação e os boatos se propagam quase instantaneamente). Depois porque tentaram limpar os defeitos à personagem principal, ele que na primeira versão era "um como os outros", vítima das revelações, mas uma pessoa com segredos e defeitos como os demais. E finalmente porque também alteraram, no essencial, o sentido de culpa do "vilão"- de uma forma explicativa que atenua os propósitos por detrás das acções, e que é uma das grandes matérias para reflexão no primeiro filme ("aquilo que não nos mata, torna-nos mais fortes?" e "os fins justificam os meios?")
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Re: Film Noir - o Tópico

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rui sousa wrote: September 15th, 2020, 8:38 pm
mansildv wrote: September 15th, 2020, 2:04 pm https://upload.wikimedia.org/wikipedia/en/7/72/Hammett_%281982_movie_-_DVD_case%29.jpg
https://en.wikipedia.org/wiki/Hammett_(film)
https://www.imdb.com/title/tt0085640/

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