The Inner Circle (1991) - Andrey Konchalovsky

[Pedro Pereira de Carvalho]

O Círculo do Poder

Hoje vou falar de um filme que vi na TV há bastantes anos atrás mas que ficou marcado na minha memória, apesar de nunca ter sido cá editado em DVD.

Filme inesquecível mas trágico, narra décadas da vida na USSR durante a época de Estaline e logo depois do seu falecimento.
A viagem é vista pelo olhos inocentes de Ivan Sanchin, magnífica interpretação de Tom Hulce, o homem que se torna o projecionista privado de Estaline.
Esta personagem foi de facto baseada num homem que o realizador conheceu enquanto vivia na Russia, o seu país natal.

É espantosa a capacidade com que por um lado Ivan Sanchin vê de uma perspectiva ingénua o mundo, e o espectador consegue aperceber-se do todo o sinistro ambiente e personagens nos círculos de poder. A personagem de Bob Hoskins como o implacável Beria é particularmente marcante.
O desencanto do personagem principal custa a chegar e às vezes fica-se mesmo na dúvida se chegou mesmo. Perdeu a sua esposa a filha adoptiva que poderia ter. Na vida real a personagem em que se baseia o filme manteve-se sempre fiel à memória de Estaline.
Um exemplo brilhante da capacidade de autoilusão, e uma lição de história, para quando as pessoas perguntam como foi possível chegar-se a este ponto? Seja a USSR da altura, seja o nazismo, esta é uma lição que todos deveríamos aprender.

Segundo os espectadores russos, a reconstituição do ambiente, fatos e costumes é certeira com a excepção das referência ao KGB - na altura era ainda o NKVD. Note-se que nas versões russas do filme aparece a designação correcta.

Trailer

[JoséMiguel]

No site oficial do realizador Andrey Konchalovsky, existe uma página do filme com screenshots, ficha técnica, curiosidades, etc.
O site tem duas línguas, inglês e russo, clickem no botão "Eng" no canto superior direito.

Página do filme: http://konchalovsky.ru/works/films/Inner_Circle/

Stalin's real projectionist on whom Konchalovsky based his main character was called Aleksandr Sergeyevich Ganshin. He offered Konchalovsky advice, watched the movie once it was finished and even went to the festival in Berlin for the premiere.

Este filme não conheço, mas gostava de o ver. A ficha técnica é curiosa, porque este filme essencialmente italo-americano é capaz de ser também o último filme soviético, pois estreou nos EUA a 25 de Dezembro de 1991, e a URSS foi extinta no dia seguinte. Do lado da produção soviética temos a colaboração do conhecido estúdio Mosfilm, provavelmente necessária para ter acesso de filmagens no interior do Kremlin, que o trailer publicita.

Enquadramento deste filme (retirado da secção "biografia" do site indicado acima):

His epic film "Siberiade", portraying almost an entire century of life in Russia, was awarded the Special Jury Prize at the 1979 Cannes Festival.

In 1980, having been granted the title of People's Artist of the Russian Soviet Federative Socialist Republic, Konchalovsky decided to head West, to work in Hollywood. It was there, in fact, that he made films that have become classics, renowned across the globe: "Maria's Lovers" (1985), "Runaway Train" (1985), "Homer and Eddie" (1990), and the American blockbuster "Tango & Cash" (1989), starring Sylvester Stallone and Kurt Russell.
During his time in America he also made "Duet for One" (1986) and "Shy People" (1987).
Since returning to Russia, the director has accomplished a great deal. He has made such films as "The Inner Circle" (1991), about life in Stalin's Soviet Union seen through the eyes of an ordinary citizen, one of the leader's projectionists;

Do cinema russo aconselho o Siberiade (épico dramático-histórico, estilo "Era uma vez na América") e do cinema de Hollywood aconselho o Runaway Train (filme de acção com nomeações para óscares de melhor actor).

Qualquer dia ainda crio um tópico do estilo "Realizador: Andrey Konchalovsky"... Até seria mais apropriado para o comentário seguinte, que pode não ficar bem neste tópico.

Já agora é isto que ele tem a dizer acerca do Steven Spielberg:

If one considers the modern commercial cinema from the point of view of art, one can see the process that is close in some aspects but at the same time different by many points from the one I've described. The place of film directors is taken by young people who came from advertising and MTV. Surely, they know the ABCs and techniques but the language and the content – the things through which the individuality of an artist is demonstrated – are an amorphous mass with them – it's practically impossible to tell a film of one film director from another. Many things on the modern film set are done by themselves: high professionals of various specialties can make a film without the film director.

A six-year old child can learn words "Action!" and "Stop!" and the film will be ready. The actors will play, the operator will shoot, the sound will be recorded and the film cutter will assemble.

All this can be applied to large American film directors. Can one call the language of Spielberg unique? It's not his language. This is the language of his photoscripter. This is the language of his film cutter. I daresay that Spielberg has no own language. Well, there is the unique language, perhaps, in a single film Saving Private Ryan, but it's the language of a talented Polish operator Janusz Kaminski. They shot several films together, including Schindler's List. But as soon as Spielberg returned to other operators, he turned to photoscripts. And it became clear that it's the operator who made his language but not he. Spielberg has no language, he is murmuring quite coherently what is said instead of him and for him by other persons.

Fonte: http://konchalovsky.ru/works/articles/v ... rt_market/

O artigo completo em inglês acima (mudem a língua carregando no botão "Eng") chama-se "Victory of Market over Art", escrito por um cineasta que trabalhou dos dois lados da cortina de ferro, em dois sistemas diferente, e foi publicado na revista "Rossiyskaya Gazeta" em 9/2/2005.

[Pedro Pereira de Carvalho]

Se queres ler algo mais com as opiniões dele recomendo uma entrevista em duas partes do realizador
http://www.opendemocracy.net/od-russia/ ... sky-part-i
http://www.opendemocracy.net/od-russia/ ... ky-part-ii

[JoséMiguel]

Boa entrevista, uma mina de ouro. Apenas ainda li a maioria da 1ª parte, mas irei citar o que ele diz do Siberiada, um dia em que escreva uma crítica desse filme. Ele também fala do colapso e contaminação do cinema russo pelo formato comercial de Hollywood, tema que me interessa bastante.

Ele levanta também a questão de que a Televisão e o tele-filme poderá ser o meio indicado para cinema de qualidade, já que o cinema de sala está nas mãos de quem está...