O ciclo normal de um filme é sala -> edição em formato físico. A sala não é um pormenor de somenos, pois é a retirada da sala de cinema e do formato físico deste ciclo, fruto do sucesso crescente das plataformas, que está a pôr em causa o sentido e o sentir do próprio Cinema. Um realizador fazer um filme sabendo que ele irá, não para a sala de cinema, mas para uma plataforma virtual, cujo catálogo é rotativo e efémero?
E ainda é (esse o ciclo normal) mas não para todo o tipo de filmes. Aliás o "cinema de autor" há muito tempo que está afastado das grandes salas. Dedicadas à sua exibição resistem 2 salas em Lisboa: o Nimas e o Ideal.
As plataformas de streaming já me incomodaram mais. Depois que a Netflix financiou o "Roma" do Alfonso Cuarón (em minha opinião um dos mais belos filmes deste início do Século XXI mais tarde editado em formato físico pela Criterion como referes) e Scorsese lhes entregou o seu soberbo "The Irishman" para distribuição, mudei um pouco de opinião. E no streaming existem plataformas de menor dimensão com programação alternativa, ex. a MUBI, Filmin, Criterion Channel etc. nem todos disponíveis nas operadoras de televisão cá da terra mas na net e com a ajuda de um cabo Hdmi podem chegar a televisão lá de casa (?)
https://www.makeuseof.com/best-streamin ... ent-films/
(não podes com eles, junta-te a eles... ou se preferirem: o bom cinema acima de tudo)
Sobre filmes "efémeros", sempre os houve. Nos anos 90 fizeram-se muitos filmes de baixo orçamento (muitas vezes rodados com câmaras de vídeo) directamente para o mercado de Vídeo. Nos anos 60 uma significativa produção de filmes italianos, ingleses, franceses série B após o período de exploração de cerca de 5 anos foram abandonados em locais de armazenamento sem condições, eram afinal produtos de entretenimento para consumir e destruir porque o seu armazenamento era dispendioso e não
havia prespectiva de os voltar a rentabilizar com excepção da exibição nos canais de tv. Actualmente uma pequena parte deles está a ser restaurada e relançada (em BD) por editoras "boutique".
https://www.cbr.com/best-boutique-blu-ray-brands/
Penso que os mais significativos e que foram feitos em pelicula sobreviverem" (ex. "Duel" de Spielberg, The Executioner's Song (1982), The Day After (1983).
Li algures que desde o início do cinema terão sido feitos cerca de 800.000 filmes (?) penso que a ser verdade muitos estarão perdidos para sempre (?). Hoje em dia com os suportes digitais isso já será mais difícil de acontecer porque as cópias (legais e ilegais) são muitas. Mesmo alguns filmes que foram redescobertose restaurados mas que só passam em televisão são copiados com recurso a placas de captura de vídeo e essas cópias distribuídas em circuitos "alternativos"
Sobre a morte do formato físico, a mim parece-me que (para já) é só por cá devido à diminuta dimensão do nosso mercado, pois no resto da Europa continua vivo. Os mercados de Espanha, França, Alemanha, Inglaterra e até a Polónia por exemplo, continuam a apresentar uma oferta significativa.
Cá já nem mesmo alguns filmes portugueses são editados (ou reeditados)
Giuseppe Tornatore fez o Cinema Paradiso em parte porque, em 1988, com a popularidade do VHS, ele tinha receio de que o Cinema acabasse e essa preocupação dele está particularmente expressa na cena do funeral do Alfredo, quando o Totó volta à aldeia, reencontra o... não me lembro do nome da personagem, e, quando o cortejo fúnebre passa junto ao Cinema Paradiso, depois de ele lhe perguntar quando é que o fecharam, ele diz-lhe "Faz seis anos em Maio. Não vinha mais ninguém. O senhor sabe... a crise, a televisão, as cassetes... hoje o cinema é apenas um sonho." Se fosse hoje, esse momento de distopia seria " o senhor sabe... a crise, as plataformas...". Felizmente, Tornatore enganou-se e as salas de cinema continuaram. Os cinemas paradiso não fecharam e eles, os cinemas, continuam a ser paraísos. Mas sobreviverão a este golpe? Não encerrarão como o cinema paradiso? Pior ainda: não serão demolidas como ele para dar lugar a parques de estacionamento? "They paved Paradise and put up a parking lot".
Umas imagens (actuais) bem tristes de uma sala de cinema que cheguei a frequentar.
https://www.abandonados.pt/cine-teatro-o-campino/
Tarantino e o futuro do Cinema
https://www.indiewire.com/2022/11/quent ... 234783494/