John Wick: pancadaria com estilo
Quantos são, quantos são? Venham eles, que Keanu Reeves não tem medo de ninguém – porque todos os outros é que têm de tremer quando ele chega, com a sua sede implacável de vingança. John Wick é uma agradável surpresa dentro dos filmes de ação que têm chegado aos cinemas, porque deve ser um dos raríssimos exemplos do género que consegue ter algum interesse para o espectador, não se resumindo aos efeitos especiais e à banalidade mais corriqueira deste tipo de histórias.
Um filme que gira em torno de uma vendetta à moda antiga: John Wick perdeu a mulher que amava, e que o fez mudar de vida e largar o passado como assassino profissional. O único elo de ligação que mantém com a sua amada está numa cadela, que a mesma lhe deixou para o protagonista não se sentir tão sozinho e perdido. Mas depois, um gangue de criminosos assalta a sua casa, rouba o seu carro e destrói a única lembrança que poderia ter da mulher. Aí, John Wick vai querer vingança, pura e dura. E quando perceber que um dos envolvidos naquele assalto implacável é o filho do seu antigo patrão, irá iniciar uma luta sem precedentes para ajustar todas as contas.
É um filme de ação? Sim, mas de uma ação cheia de adrenalina e com alguma minúcia na sua preparação, algo que não conseguimos encontrar regularmente nesta nossa modernidade, dominada por efeitos especiais utilizados para tudo e para nada. E ao contrário da maioria dos seus congéneres, John Wick cumpre as premissas que qualquer filme de ação deveria ter como palavra de ordem: entretenimento exequível e agradável, bem ritmado e executado, onde os clichés misturam-se, e bem, com o estilo da personagem (e sim, Keanu Reeves ainda consegue ser o patrão!). O resultado? Uma história que passa depressa, que não nos faz levar as mãos à cabeça, e que nos entretém, à séria, durante pouco mais de 100 minutos.
Que se digam todas as barbaridades e que se atirem todos os preconceitos (injustos, na maioria) contra os filmes de ação, mas queremos acreditar que há uma linha que separa as andanças de filmes-chiclete como Os Mercenários, e as características de um filme como este – que, não sendo alguma coisa de outro mundo, que irá alterar a Humanidade ou a perceção que temos do cinema, não nos faz, também, pelo contrário, suplicar por misericórdia, contrariamente às experiências levadas a cabo pela trupe de veteranos dos filmes “machos” dos anos oitenta liderada por Stallone. John Wick não prima pela originalidade, mas pela eficácia atribuída ao seu conceito ultra-conhecido – e aí está o seu ponto mais forte, tal como a maneira utilizada para conduzir a história, fora de mecanismos mais risíveis a que estamos habituados a encontrar em histórias deste calibre.
Uma aposta muito interessante (e improvável) do filme está no seu lado cómico, assente em cenas completamente imprevisíveis, que dão à inverosimilhança da maioria dos momentos da história um outro fulgor. E talvez seja isto que se possa designar como bom entretenimento (apesar de, por esta altura, a palavra “entretenimento” ser, para muitos, um sinónimo de maldições satânicas). Apesar de não ser um filme que se vê para, rapidamente, se esquecer (há um ou outro momento verdadeiramente memorável no filme – e aqui tem de se voltar a congratular Keanu Reeves, como também alguns dos atores secundários, como Willem Dafoe), esse acaba por ser o seu objetivo. Mas o tempo que investimos a ver John Wick acaba por ser, até, bem recompensado – e, como sugestão de agradável divertimento cinematográfico, sai completamente vencedor.
Porque para se gostar do cinema mais complexo, é preciso, também, visitar este “outro” cinema, mais leve (em filosofia, não em barulho e efeitos sonoros), e não é nenhum crime ver-se uma história com as dimensões dramáticas e exageradamente violentas de John Wick. O espectador poderia sair muito mais defraudado com outras fitas do mesmo formato, que não tivessem, sequer, o estilo e o charme que emana este filme – e que, parecendo que não, é algo que acaba por fazer nele toda a diferença, tal como para o seu conteúdo, as suas personagens, e as suas dimensões psicológicas relativas.
Não sendo mais um exemplo do cinema de ação mais formatado ou desinspirado, John Wick consegue ser, ao mesmo tempo (e apesar das convenções da sua narrativa e da sua produção), uma singela homenagem aos elementos mais interessantes desses filmes, e uma curiosa investida no meio, apostando menos no CGI e mais em elaboradas coreografias, e em diálogos que não são nada dispensáveis. Keanu Reeves ressuscita num dos papéis mais revigorantes e mais cool da sua carreira (e o único que conseguiu suscitar algum interesse, desde a saga Matrix) e o público, pensamos nós, poderia pedir mais filmes assim – que possuam entretenimento, mas que também não usem esse entretenimento de uma maneira mais desleixada, para propiciar uma construção que tem como único objetivo tornar-se instantaneamente descartável.
7.5/10