Il Portiere di Notte (1974) - Liliana Cavani

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Pedro Pereira de Carvalho
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Il Portiere di Notte (1974) - Liliana Cavani

Post by Pedro Pereira de Carvalho »


O Porteiro da Noite

http://www.imdb.com/title/tt0071910/combined

Estive hoje a rever este filme que deixou imagens nas minhas memórias quando o vi sem saber ao certo o que via há muitos anos atrás na TV.
Não é um filme fácil de ver e é algo perturbador, vê-se com algum incómodo, ou mesmo com algum sentimento de culpa. Ao invés do que as imagens de propaganda do filme sugerem, não se trata de um filme que entre no reino da pornografia, ou sexploitation. É mesmo algo comedido, temos apenas alguma cenas de nudez nos flashbacks do campo de concentração nazi, mas que acabam por ser mais perturbadoras que outra coisa.
Quase teatral na sua essência, é considerado um "art movie" europeu dos anos 70, respeitado pela crítica europeia, mas desprezado pela crítica americana, talvez por ser um filme que desafia convenções. O estranho amor, ou talvez obsessão seja a melhor palavra, entre os dois protagonistas não ajuda com certeza. Curiosamente é dirigido por uma mulher, a italiana Liliana Cavani, pertencente a uma família de antifascistas e autora pioneira de vários documentários premiados sobre o regime nazi.
Inspirado sem dúvida pelo filme Os Malditos - "The Damned" de Luchino Visconti, onde ambos os protagonistas do filme também participaram, não atinge a grandeza operática deste, mas não deixa de ser igualmente perturbador, embora num universo mais contido.

Viena, 1957. Um olhar é trocado entre o porteiro de um hotel e a mulher de um dos seus hóspedes. O reconhecimento é imediato e mútuo. Trata-se de um sádico ex-oficial nazi e uma das suas antigas prisoneiras. Ao invés de ser denunciado recomeçam uma estranha relação sadomasoquista, com consequências desastrosas para ambos. Ele faz parte de uma rede que esconde outros nazis, que ao descobrirem a relação se sentem ameaçados e vão fazer o possível para afastar uma potencial testemunha dos seus crimes.

Os actores protagonista são fascinantes nos seus papéis. Dirk Bogarde, que na vida real foi um homossexual escondido, foi condecorado sete vezes durante a 2ª Guerra Mundial e esteve envolvido na libertação de prisioneiros num dos campos nazis, enverga o papel do complexo e algo sádico ex-oficial Max. Charlotte Rampling como Lisa, a sua vítima e amante, surge num papel em que talvez tenha o síndrome de Estocolmo, num filme possívelmente anterior à altura em que este termo surgiu pela primeira vez.
Dirk Bogarde que se afastou de promissor actor de Hollywood para enveredar por filmes que o desafiavam como actor, é minucioso e trabalha muito à custa do seu olhar num papel turtuoso e difícil, com quem o espectador acaba por sentir alguma empatia apesar de tudo, pois arrisca tudo e todos pelo seu amor ou obsessão. Após o filme Dirk Bogarde considerou mesmo retirar-se do cinema pois este filme deixou-o esgotado emocionalmente.
Charlotte Rampling que por ter começado a vida como modelo não foi perturbada pelas cedas de nudez, sempre gostou de desafiar as convenções num grande número de filmes em que participou, e aparece como uma figura estranha, algo andrógina - penso que a ideia seria que a relação inicial incluísse um pouco de pedofilia, a relembrar Lolita - não é por acaso que Max se refere a ela como "a minha menina" quando a reencontra - mas ela já era suficientemente adulta na altura para não provocar esse impacto. Max fica fascinado desde que a viu pela primeira vez - a cena com a câmara a filmar os prisioneiros e a deter-se no rosto dela é significativa. Algum tons homossexuais, como a figura do nazi bailarino Bert e uma cena das memórias de ambos do campo de concentração provocam o espectador e contestam o mito habitual nazi.

Filmado nuns tons pálidos e cinzentos que acompanham o tom desesperado e fatalista do filme, acompanhado pela música de fundo da ópera A Flauta Mágica de Mozart, que acompanha na perfeição o ambiente do antigo hotel. Mas as cenas que acabam por deixar mais marcas são as cenas dos flashbacks do campo de concentração. Entre elas a icónica canção da protagonista, vestida apenas com calças de suspensórios e boné de um uniforme nazi, canção essa num ambiente de cabaré com uma música que Marlene Dietrich popularizara.
No entanto todo o filme é povoado por uma imaginativa imagem, como o vestuário do porteiro a lembrar o antigo uniforme de Max, a claustrofobia dos apartamentos onde se passam as cenas, e a irónica - por parte de Max - saudação Sig Heil aos seus ex-companheiros, com a resposta automática deles.

O DVD exclusivo da FNAC (editora Monroe Stahr) é semelhante à edição da Criterion, com um menu simples e sem extras, apresentado em full widscreen (1.85:1). Alguns diálogos, especialmente as reuniões de ex-nazis parecem forçados, provavelmente pela dobragem ou dicção dos actores italianos para inglês.
Pedro Pereira de Carvalho - 56 anos - Lisboa
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Re: Il Portiere di Notte (1974) - Liliana Cavani

Post by JoséMiguel »

Excelente texto Pedro, adicionado à minha longa watchlist.

Encontrei no You Tube o segmento flashback, de onde foi retirada a capa do filme:
E um trailer no presente:
Pedro Pereira de Carvalho
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Re: Il Portiere di Notte (1974) - Liliana Cavani

Post by Pedro Pereira de Carvalho »

Só uma nota em relação ao segundo trailer que o José Miguel colocou. A música italiana que o acompanha, embora quase de certeza inspirada no filme - afinal tem o mesmo nome do filme - não faz parte da banda sonora. A música utilizada no filme é de Mozart, da ópera A Flauta Mágica.
Pedro Pereira de Carvalho - 56 anos - Lisboa
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Re: Il Portiere di Notte (1974) - Liliana Cavani

Post by nimzabo »

Acabei de ver e é um excelente filme
yes-)
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