Apontamentos sobre o livro, os filmes e a censura:
"Lolita, luz da minha vida, fogo da minha virilidade... pecado meu, minha alma. Lo-li-ta ... Foi Lo, simplesmente Lo, um metro e trinta e dois com os pés descalços. Era Lola com calças... foi Dolly na escola...foi Dolores na linha pontilhada onde assinava o nome... mas em meus braços foi sempre Lolita ".
É basicamente assim, desta forma que insinua uma relação nada normal que começa um dos romances mais controversos da literatura contemporânea, Lolita, publicado pela primeira vez em setembro de 1955. O seu autor, Vladimir Nabokov (1899-1977), era um emigrante russo que, com sua família, partiu para o exílio após a revolução bolchevique, primeiro na Alemanha em 1919 e depois em 1940 instalou-se nos Estados Unidos após de ter estudado filologia em Cambridge, e finalmente em 1959 mudou-se para a Suíça, onde viveu até à morte. Os protagonistas dos seus livros são geralmente personagens que vivem uma paixão anormal num mundo de aparente normalidade. Lolita, o romance mais célebre de todos os que escreveu é o exemplo óbvio disso. Com o subtítulo de "Confissões de um viúvo", é uma mistura intoxicante de violência disfarçada de afecto, de desculpas, de diário de prisão e súplica ao jurado que julga o professor de literatura Humbert Humbert - na defesa que ele faz de si próprio - e o relato da história de "amor" de um quarentão pedófilo com uma menina de 12 anos anos que, além disso, é sua enteada. Escrito com todo o cuidado e talvez inspirado por um caso verídico acontecido alguns anos antes
http://hazlitt.net/longreads/real-lolita , na primavera de 1954, Nabokov já havia preparado um primeiro manuscrito e apresentou-o a quatro editores americanos (Farrar Straus, Viking, Simon & Schuster e New Directions). Nenhum deles aceitou. "Você acha que eu sou louco?", terá mesmo dito um dos editores. Outros expressaram o seu medo da censura e até de acabar na prisão. Finalmente, um ano depois, uma pequena editora francesa, Olympia Press, especializada em literatura erótica e edição em inglês com o objectivo de contornar a proibição nos Estados Unidos e Grã-Bretanha, realizou uma primeira edição de cinco mil cópias em dois volumes, cheia de erros tipográficos (curiosamente a sua publicação em língua francesa foi proibida). Foi colocado à venda em Setembro de 1955 e esgotou rapidamente. Um dos que leram essa primeira edição foi Graham Greene, que para a sua selecção literária feita no jornal britânico The Sunday Times sobre os melhores livros do ano escolheu Lolita. De imediato, o Sunday Express reagiu e seu diretor disse sobre o romance que era "o livro mais sujo que eu li", "pura pornografia desenfreada". Durante dois anos, cópias de Lolita foram proscritas pelas autoridades e apreendidas pela polícia. Nos Estados Unidos, a primeira edição foi feita pela Putnam quase três anos depois em Agosto de 1958, quando McCarthismo já estava a terminar. O livro foi um sucesso, várias edições mais sairiam e diz-se que Lolita vendeu mais de cem mil exemplares nas primeiras três semanas, algo que não acontecia desde que em 1936 fora publicado E Tudo o Vento Levou. Lolita entrou na mitologia literária. A censura, no entanto, manteve a sua atenção na obra. Assim, quando em 1962, com o argumento do próprio Nabokov, Stanley Kubrick decide transpô-lo para o cinema teve que, para ultrapassar problemas com a censura aumentar a idade do protagonista de 12 para 14 anos e enfrentou a também recusa de vários actores conceituados para interpretar o papel de Humbert. Finalmente, Sue Lyon a escolhida para o papel de Lolita tinha 16 anos e, sendo menor, não podia comparecer à estreia embora quando a rodagem começou tivesse apenas 15, o seu aspecto fazia-a parecer mais adulta do que realmente era. É sabido que uma coisa é o cinema e outra é a literatura, que são línguas diferentes, mas então tem que se concordar que serão diferentes lolitas (a do livro e a do filme). Aliás ao ler o original não é credível ao ver Sue Lyon como Lolita. Com o filme de Kubrick, a popularidade da obra de Nabukov aumentou, outras edições foram feitas e tornou-se uma nova entrada nos dicionários, que definiu como uma "atraente, sedutora e adolescente". E continuaria a ser controlado pela censura durante os 35 anos seguintes pois quando em 1997 o realizador britanico Adrien Lyne voltou a adaptar o livro ao cinema, o seu filme demoraria quase um ano a encontrar distribuidora nos USA e tendo custado 60 milhões rendeu em bilheteira pouco mais de 1.4 milhões. Curiosamente, e certamente sem intenção de justificar nada, dizem os entendidos que a obra de Nabukov quando comparada com o ignóbil Josefine Mutzenbache escrito em 1906 por Felix Salten, também autor do ternurento Bambi, imagine-se, até é quase um exemplo de candura.
No cinema outras obras com o "complexo de lolita" surgiriam, mais ou menos escandalosas, mas sempre apontadas como obras imorais; Twinky (1970) realizado por Richard Donner, Pretty Baby (1978) realizado por Louis Malle, Piccole labbra(1978) realizado por Mimmo Cattarinich, L'amant (1992) realizado por Jean-Jacques Annaud, Nothing Is Private (2007) Alan Ball... e até um brasileiro Alberto Salvá faria em 1987 o "ousado" A Menina do Lado com Reginaldo Faria e Flávia Monteiro, banido até hoje, depois de uma curta carreira
http://www.imdb.com/title/tt0235578/?ref_=nv_sr_1 só para citar alguns dos referenciados nos blogs sobre Lolita