waltsouza wrote:Boa crítica (sem spoilers, para quem ainda como eu não viu o filme) Cabeças.
Uma coisa que leio com frequência noutros sitios, e tu não referes, é que este The Revenant puxa muito pelo lado emocional, e que é extremamente poderoso nesse aspeto. Di Caprio ao que parece pouco fala durante o filme mas os seus olhos, as suas expressões, a sua prestação essencialmente física são os pontos fortes de uma prestação que deve ter exigido bastante dele.
Aliás, basta ler um dos artigos acima para perceber que as filmagens deste filme foram muito complicadas e de uma exigência quase extrema. Sobretudo pelo sitio onde acontecem as filmagens, muito agreste, por sinal.
Sim, essa parte quis dar a entender na tal parte do "excesso de dramatizações" e no tal "filme feito propositadamente para um actor". Não posso desenvolver muito mais por causa dos spoilers. Mas sim, é uma boa interpretação do Di Caprio. Mantenho todavia a sensação de que está montado um grande trabalho desde o início a pensar no óscar, o que se calhar não tem mal nenhum, todos ou quase todos se calhar pensam nisso. Mas até quando saíu para a comunicação social que ele até tinha comido fígado cru dá a entender que é mesmo para chamar a atenção para ele. O Di Caprio até pode ter comido fígado cru, mas se lhe grelhassem as iscas, quem ia saber?!
Achei um bom filme. Fotografia deslumbrante, enorme empreendimento técnico (os grandes planos das personagens tal como existiam no Birdman, com lentes ultra-grande-angular mesmo em cima dos rostos dos personagens, têm agora como cenário de fundo paisagens naturais majestosas), boas prestações dos actores principais, e uma história clássica de sobrevivência e vingança, à boa maneira de Hollywood. Mas do velho se faz novo, e o Western mitológico tal como o conhecemos dá lugar a uma versão modernizada que cospe na velha estrela polida de sheriff - não há qualquer intenção aqui de glorificar o oeste nem os seus pioneiros, e tudo nos é apresentado de forma muito crua, sórdida e cruel (sei que, apesar do "CGI-batota", o José Miguel vai apreciar a vertente realista do projecto). Há uns quanto pózinhos do misticismo existencialista cultivado por Terrence Malick, mas o olhar é bastante mais "terreno", mais próximo daquilo que Kurosawa nos ofereceu em Dersu Uzala, apesar de lhe faltar depois toda a ternura e apreço pela vida presentes nessa obra do mestre.
Não daria o Oscar ao Di Caprio por esta interpretação (não que seja má - antes pelo contrário - mas porque acho que não tem um papel à altura dessa grandeza), mas como ele vem acumulando prémios em dívida, aposto que vai ser ele o vencedor este ano.
«The most interesting characters are the ones who lie to themselves.» - Paul Schrader, acerca de Travis Bickle.
«One is starved for Technicolor up there.» - Conductor 71 in A Matter of Life and Death
Nos confins da última fronteira, uma história de sobrevivência, vingança e redenção.
Alejandro Iñárritu é um dos meus realizadores favoritos, ainda não lançou um filme que eu gostasse.
"The Revenant" eleva o seu trabalho ao patamar dos grandes maestros do cinema, capazes de liderar com firmeza um exército de técnicos e artistas e extrair todo o potencial dos mesmos.
A escala em "The Revenant" é à medida da cinematografia espantosa, que faz dos espectadores poetas, assombrados pela mais pura beleza dos grandiosos exteriores.
Iñárritu não se limita a deslumbrar visualmente, os seus temas recorrentes (o sofrimento, a morte, a dificuldade na comunicação) estão aqui presentes no extremo oposto da escala, íntimos, crus e viscerais como sempre.
A sua realização - nada menos do que sublime! - oscila, alterna e une magistralmente uma proximidade brutal, desconfortável e desconcertante, algo já habitual no cinema do realizador, e uma admiração pelo horizonte infinito, pela inevitabilidade de uma natureza bela e fatal, numa execução que faz lembrar os melhores momentos do lendário Terrence Malick.
Em termos técnicos, a realização de Iñárritu é uma evolução de "Birdman", também aqui apostando em planos longos e estudados, abordagens frescas e inovadoras que surpreendem ao longo de todo o filme, mas sem que se tornem elas próprias o centro do mesmo.
Ao serviço da história estão também os magníficos efeitos visuais, omnipresentes na recriação dos ambientes extremos, mas nunca roubando qualquer protagonismo.
Leonardo DiCaprio dispensa apresentações, é um dos mais importantes actores da sua geração, com uma galeria invejável de trabalhos, ao serviço dos maiores realizadores.
No entanto, as personagens que interpretou foram sempre limitadas pela sua expressão dramática, alternando entre o bonzinho com o olhar indignado e o snob cínico e insolente.
Na minha opinião, assistimos em "The Revenant" à libertação de DiCaprio, um adeus aos seus maneirismos habituais, resultando numa verdadeira explosão do seu talento escondido e da sua potencial expressividade, em particular durante as muitas cenas em que está impossibilitado de falar, onde conta apenas com as suas expressões faciais e um olhar com uma intensidade e honestidade inéditas na sua carreira. Excepcional.
Não poderia esquecer uma referência muito especial ao Tom Hardy, em mais um desempenho notável do actor que foi Bronson, Bane, e segura agora o papel de Mad Max.
O desempenho de Tom Hardy como antagonista de DiCaprio é uma das mais valias do filme, apesar de todo o elenco estar de parabéns. .
"The Revenant" é cinema a sério.
Intenso, brutal, épico, visceral,... perdurará na memória dos cinéfilos como um filme poderoso, um dos melhores de 2015, um trabalho magistral a todos os níveis, que peca apenas (ou não, dependendo da interpretação e gosto pessoal) por alguma dispersão narrativa, que pode alienar audiências menos apaixonadas.
No meu caso, estou rendido.
Ser Tarkovsky ou Malick não é para quem quer, é para quem pode. Viu-se muitas influencias, quer de câmara quer de narrativa, para tornar a experiência o mais poética e filosófica possível mas falhou. Isto é, a premissa base de tais elementos estão lá, mas dar o próximo passo é que já foi dificil. Pelo menos não consegui ter aquela experiência sensorial, aquele click digamos, que o Iñárritu queria passar. La está, não é para todos (mesmo na sua death trilogy ter conseguido algo melhor neste aspecto). Senti sim que havia uma certa harmonia entre a natureza, o homem, a vida onde estes era tanto o bem como o mal: a natureza quase que o matou, o homem fá-lo sofrer em várias frentes e a vida parecia quase sempre a morte. - Agora, toda esta exploração não conseguiu atingir o verdadeiro patamar que por exemplo os 2 realizadores que citei no inicio dão aos seus filmes. O que foi pena, penso que o material e as condições estavam lá todas.
Na parte técnica, para quem conhece Iñárritu, ou para quem não conhece e só viu o seu último filme (Birdman) sabe do portento de qualidade que ele costuma colocar lá. Neste caso ele só é noticia quando faz algo medíocre.
Aqui foi praticamente tudo no ponto, onde o auge foi o filme ser feito lá, no meio do nada e naquelas condições brutais de se trabalhar. Isso sim, dá logo outra autenticidade e naturalidade ao que se vê, que depois lá está, a experiência torna-se logo outra. Isto em IMAX devia ser um luxo.
Curiosamente, e além de ter achado o Di Caprio bastante bem, tal como o Hardy, se lhe tivesse que dar o óscar, dava-lhe mais depressa no Wolf Street que neste aqui. Ainda me faltam ver 2 dos 5 nomeados, mas neste momento é o meu preferido.
7.5/10
PS: Foi só impressão minha ou o filme tinha partes que por vezes a imagem não era nítida o suficiente? Não sei se era da minha sala, mas por vezes tinha dificuldades em ver tudo a 100%.
PS2: Sessão com inicio à 00h10 e ainda eram 00h35 e a publicidade sempre a dar-lhe forte e feio. Daqui para a frente têm que começar a ter 2 tipos de horários. Um com a pub e trailers e o outro com a verdadeira hora do filme começar. Eu sei que os cinemas têm que ter receitas etc etc etc, mas chega a ser ridículo esperar tanto tempo. Ainda por cima eu que não gosto nada de trailers e tenho sempre que desviar a cabeça para o lado.
Já me tinham dito que o filme era muito longo, mas ninguém me tinha preparado para o verdadeiro bocejo que presenciei.
A verdade é que o inverosímil “The Revenant”, tal como o Cabeças muito bem apontou, foi nitidamente “cozinhado” para os oscars. Sim, já sei que foi baseado numa histórica verídica, mas meus amigos…o super-homem não existe.
Vamos por partes.
O pior :
A história arrasta-se, tal qual Hugh Glass se arrasta pela neve na maior parte do tempo.
Por outro lado todo o trágico episódio foi descaradamente extrapolado, ou seja, a razão foi levada para lá do sério e do credível, à boa maneira de Hollywood que mais uma vez não hesitou em usar o seu fermento mágico para levar um episódio de vida real a um patamar que roça o índice dos records do Guiness Book. Ao longo das intermináveis 2h40 deste épico artificial podemos observar sucessivos “milagres da natureza”, que não escapam nem ao espectador mais desatento. Vão-se assim acumulando várias situações sem nexo ou fundamento nenhum, coisas que foram de certo acrescentadas pela produção e mesmo pelo Iñárritu, no geral acontecimentos que no fim retiram uma boa dose de credibilidade a este “O Renascido”, o que acaba na minha perspectiva, por diminuir o filme.
Registei também certas atitudes de algumas personagens que, da mesma forma, foram igualmente desprovidas de qualquer racionalidade e incoerentes com toda a narrativa. Como disse, tudo isso contribuiu para que um filme, que se queria minimamente realista e que me poderia ter arrancado um forte aplauso mental no fim do mesmo, fosse catapultado para o expoente máximo da extra-ficção, recente género original da fábrica de construir sonhos e criar ilusões fantásticas. Para mim o argumento adulterado foi mesmo o pior de tudo, e a previsibilidade do desfecho não ajudou nada também.
A banda sonora - nada por aí além.
Pelo contrário, senti que algumas músicas não encaixaram bem com as cenas que decorriam, e pior é o facto de saber que existem algumas faixas instrumentais que ficariam muito melhor neste “The Revenant”. Neste campo o filme poderia ser também muito melhor.
DiCaprio :
Mais uma vez não me convenceu…mas por sua vez nota-se que ele está mesmo convencido que é desta vez que vai enfeitar a sua sala com a estatueta dourada. Para mim os oscars “cozinhados” não contam. Prestações preparadas nitidamente com esse objectivo não valem para nada.
Tenho lido que Michael Fassbender merece mais o oscar pela sua excelente prestação em “Steve Jobs” , filme que ainda não tive a oportunidade de ver mas que espero confirmar o que se tem dito por aí.
O bom:
A fotografia/filmografia.
Aqui o realizador está de parabéns, e nem será preciso justificar muito, basta ver o filme para se perceber como a mãe natureza arranca um merecido oscar sem ter a mínima pretensão para tal. A ousada mestria e o profissionalismo apurado com que muitas sequências de acção foram filmadas (nem entendi muito bem como é algumas delas foram filmadas…) é outra das mais valias deste “The Revenant”.
O ataque da Ursa.
Selvagem, cru, potente à vista. Grandes efeitos visuais e sonoros.
Idem para a caraterização das feridas da vitima. Top mesmo.
Tom Hardy
Aqui mete o DiCaprio num bolso em termos de representação.
O DiCaprio foi…DiCaprio (mais uma vez) com as mesmas expressões, só que desta vez passa mais tempo a grunhir e a fazer caras feias. A relação pai/filho também não convence porque falta a química entre ambas personagens.
Já Tom Hardy…bem, o homem transfigura-se completamente conseguindo sempre descartar facilmente a pele das personagens que encarna. Mesmo com o seu papel minimalista e com muito menor tempo de ecrã Hardy rouba e abafa o protagonismo todo, de tal modo que fiquei com um ódio de morte à sua tão bem representada personagem. Só me lembro de um Daniel Day-Lewis, de um Fassbender ou de um Cristian Bale que equiparam o seu talento.
Mesmo assim se o oscar não for para ele não me importo muito pois pelo que tenho lido e pelo que ouço se calhar a Stallone será bem entregue.
De resto penso que já quase tudo foi dito relativamente a outros aspectos do filme, mas pessoalmente vou muito ao encontro com as opiniões do Cabeças e do PanterA.
Esperei ler as críticas, mas eu fiquei desapontado com o filme, é um bom filme, mas como dito é nitidamente feito para ganhar "prêmios", menos o de roteiro. É o favorito para Oscar, ainda mais agora depois de ganhar o Bafta, esse ano tirando o de ator/atriz coadjuvante os prêmios foram muito parecidos em termos de candidatos.
Afinal tudo e todos apontavam-no para oscar de melhor filme e acabou por vencer "Spotlight". Não se perdeu nada.
Parece que os membros da academia estão atentos e não paparam a história da carochinha como diziam as previsões.
Ou então adormeceram a ver o filme.
Lá fui eu ver o filme, e escrevi um pequeno comentário no meu blog, que aqui transcrevo:
Di Caprio chora, Di Caprio respira, Di Caprio sofre, Di Caprio tem frio, Di Caprio sonha com os traumas do passado. Apesar de todos estes sentimentos, não se sente humanidade em «The Revenant». A culpa não é do actor (nem do fabuloso Tom Hardy), mas da realização de Iñarritú, que se em «Birdman» ainda atenuou alguns dos principais problemas dos seus filmes anteriores, aqui volta atrás e espalha-se ao comprido. E convém também lembrar que não é a filmar a natureza que se tem uma boa cinematografia. Se há planos belos no filme, não o são por causa do cineasta e do seu director de fotografia, mas por causa das paisagens. A imagem não acrescenta nada ao ambiente, apenas o expõe para daí retirar, injustamente, mérito de uma aparente "tentativa de transcendentalidade" (absolutamente falhada, diga-se). É algo tão meritório como o que faz qualquer documentário da BBC. No entanto, alguns momentos do filme conseguem funcionar quando o "virtuosismo" do realizador, mais a sua filosofia pirosa de terceira categoria (nem sei se o Chagas Freitas conseguiria tamanha proeza), não se sobrepõe ao que aqui verdadeiramente interessa: as falhas humanas, o dilema das personagens, o instinto de sobrevivência. São raros, esses momentos, mas quando acontecem (quando a câmara acalma a sua hiperactividade de querer mostrar tudo e todos ao mesmo tempo, quando deixamos de ouvir aquelas vozinhas interiores que empatam tudo, quando o urso já não está lá - e este é um momento acidentalmente hilariante no meio de toda a disparidade de situações em que Leo se envolve), parece que vemos um rasto de luz. «The Revenant» poderia ter sido um grande filme, se Iñarritú não tivesse tentado fazer uma espécie de rebento saído de uma hipotética relação amorosa entre Terrence Malick e Christopher Nolan. De ambos retira alguma coisa má. Do primeiro, é a metafísica existencial de vão de escada, que em nada favorece o cineasta, mas que mostra a preguiça do mesmo para utilizar outros métodos, que não os mais previsíveis e vazios, para falar do divino e do Homem. Do segundo, é a "seriedade" excessiva do material, que seria óbvia já que estamos a falar de vingança, e mortes, e eteceteras, mas o facto de se ser sério nas coisas mais banais, nos pormenores parvos e dispensáveis, tira toda a subtileza que poderia ser obtida nos momentos de verdadeira tensão (que acontecem no confronto entre Hardy e Di Caprio, e na constante involução ética do antagonista), e dá a «The Revenant» alguns momentos de verdadeira galhofa. Mas coitado do Di Di, ele está muito bem no papel, tem muitos arranhões e deita bastante sangue do corpo inteiro, vamos dar o Oscar porque quando ele verdadeiramente merecia (n'«O Lobo de Wall Street» por exemplo) não nos lembrámos de lhe atribuir tal prestigiosa aclamação.
"...ainda atenuou alguns dos principais problemas dos seus filmes anteriores."
Que problemas é que falas? E presumo eu que não te referias directamente à Death Trilogy do senhor que não consigo deslumbrar o que possa ser assim tão mau.
Atente-se bem nesta pérola do jornalismo ou crítica:
"Não há outra explicação para o sucesso de Iñarritu, odiado fervorosamente por legiões de cinéfilos e críticos de cinema, várias vezes apontado como um dos "piores realizadores do mundo"."
PanterA wrote:"...ainda atenuou alguns dos principais problemas dos seus filmes anteriores."
Que problemas é que falas? E presumo eu que não te referias directamente à Death Trilogy do senhor que não consigo deslumbrar o que possa ser assim tão mau.
Há uns anos eu gostava dos filmes do Iñarritú. Nos dias de hoje já olho para essa trilogia com outros olhos. Não consigo gostar daquelas histórias e da fragilidade das suas ligações emocionais... e o The Revenant vai um pouco atrás disso, com as pseudo-filosofias à mistura.
DarkPhoenix wrote:Rui Sousa, tens futuro como crítico de cinema no Público.
Lá também se atiram ao pescoço dos filmes, assim com essa garra.
Dark, não é meu objectivo ser comparado com os críticos do Público (principalmente com o Vasco Câmara, que mais não faz do que publicidade aos filmes que são distribuídos por amigos dele, e a filmes "trendy" duvidosos). E eu não desgostei totalmente do filme... o maravilhamento é que não me surgiu, nem mesmo o ódio - nestes filmes que polarizam tanto opiniões, em 90% dos casos acabo sempre por ficar no meio, indiferente. O comentário escrito foi feito em três tempos, sem grandes preocupações.
Eu continuo a defender que, desde que as pessoas consubstanciem as suas opiniões, mesmo que não concordemos não vale muito a pena entrar em lógicas de tentar convencer os outros que nós é que estamos certos.
Eu da primeira vez que vi o Fury Road não gostei nada (vi uns 15 minutos) e agora que vi o filme todo gostei bastante! Comprei o bluray e dentro de algum tempo sei que o vou querer ver novamente. No tópico apropriado desenvolvo os argumentos.
O Revenant para mim foi um filme demasiado longo, demasiado chato, demasiado a puxar para o dramático, demasiado a puxar para o óscar, e tão exagerado que agora até o acho um bocado cómico. Não o tenciono comprar, nem tenciono voltar a vê-lo. Sinceramente.
Mas não me chateia absolutamente nada que haja pessoas que adorem o Revenant, caramba! Penso que, como referi, vale sempre a pena expor os argumentos, mas sem entrar nas guerrinhas do costume...
