Fiz um trabalho no 1º ano de mestrado sobre o cinema português, e entrevistei dois doutorandos e especialistas de cinema, se alguém tiver interesse em ler, está aqui:
http://www.incomunidade.com/v25/art.php?art=14
Mas basicamente o que tenho a dizer sobre esta época (de ouro), em relação à qual não sou honestamente objetivo, é o seguinte (não falo muito do que penso, porque era uma reportagem, e o que interessava era ouvir os entrevistados, mas acho que dá para perceber que sou "fã" destes filmes):
A “Comédia à Portuguesa”
O fenómeno sociológico do cinema clássico português, representado em obras tão icónicas como “A Canção de Lisboa” (1933, Cottinelli Telmo), “O Pai Tirano” (1941, António Lopes-Ribeiro), “O Pátio das Cantigas” (1942, Francisco Ribeiro), “O Leão da Estrela” (1947, Arthur Duarte), e em atores tão carismáticos como Vasco Santana, Ribeirinho e António Silva, transcende épocas, gerações e até sistemas políticos, sendo ainda um fenómeno de popularidade surpreendente, como o comprovam as várias edições em DVD e as sempre constantes reposições na televisão, em épocas festivas.
Paulo Cunha, doutorando em Estudos Contemporâneos, com um projeto de investigação sobre o Novo Cinema Português, na Universidade de Coimbra, considera que “obviamente, o cinema, sobretudo pela sua capacidade de comunicação de massas, foi um instrumento privilegiado para divulgar e reproduzir a mensagem ideológica do regime”
Em filmes que foram considerados pela maioria dos críticos como “comprometidos” com o regime da época, como se compreende esta longevidade? Será que entre a “submissão” à trindade Deus, Pátria, Autoridade, se escondia a (possível) irreverência e contestação? Ou será que o público contemporâneo lê nestes filmes mais do que lá está, inconscientemente “refletindo” os problemas das épocas em que se assistem às impagáveis “comédias à portuguesa”?
Luís Vintém, licenciado em Ciências da Comunicação pela Universidade Nova de Lisboa e professor de Comunicação Audiovisual e Fotografia, na Escola Superior de Tecnologia e Gestão, em Portalegre, distingue dois momentos no corpus das obras feitas durante o período do Estado Novo: o primeiro momento é o em que a ideologia do regime influencia o conteúdo das narrativas cinematográficas, e onde “transparece o optimismo da segurança, da ordem e do progresso material, a mitologia da identidade portuguesa, o mito da genuinidade do camponês, a paz entre as classes e a ideia da mobilidade social”, destacando como exemplos os já referidos “O Leão da Estrela”, “O Pátio das Cantigas” e ainda a “Aldeia da Roupa Branca” (1938, Chianca de Garcia).
Paulo Cunha, também membro da direção do Cineclube de Guimarães (o maior do país), e um dos maiores especialistas sobre o cinema português, corrobora a tese de Luís Vintém, declarando que “as comédias à portuguesa não deixavam de transmitir um ideário político e social que, mais do que fascista ou estadonovista, era dominante na época. O respeito pela autoridade e hierarquia (familiar, laboral ou social), o ideal rural, a moral cristã, entre outros, são valores que estão presentes e são promovidos nesses filmes. Mas trata-se sobretudo de uma ideologia contextual, que ultrapassa a própria acção do regime”.
Destaca ainda que o Estado Novo financiou apenas dois filmes de propaganda declarada, “A Revolução de Maio” (1937) e “O Feitiço do Império” (1940), ambos de António Lopes-Ribeiro, mas que toda a produção cinematográfica portuguesa das décadas de 30 e 40 foi condicionada, através da criação dos estúdios da Tóbis e a atribuição de prémios e subsídios para a produção de filmes, “foram apenas algumas formas de pressão que garantiam ao regime a colaboração dos produtores de cinema”.
O segundo momento do cinema do Estado Novo que Luís Vintém realça, é a altura em que começam a aparecer as vozes críticas, sendo estes dois períodos paralelos com a vida e a evolução do próprio regime e da sua aceitação pela sociedade, que “coincide aproximadamente com o início da Guerra Colonial e das primeiras grandes contestações públicas ao regime nas eleições presidenciais de 1958. Para além do desgaste do regime, começam a chegar ao cinema português os ecos do neo-realismo italiano”, nos filmes “Dom Roberto” (1962, José Ernesto de Sousa) e Verdes Anos” (1963, Paulo Rocha).
Na baliza Jackson, defesa com Scorsese, Coppola, Spielberg e Eastwood. No meio campo, Ridley Scott, Wes Anderson, Pollack e Carpenter. Avançados, Woody, e solto nas alas Tarkovsky. Suplentes: Bunuel, Fellini, Kurosawa, Visconti, Antonioni, Lynch e Burton.