Qual foi o último filme que viram ?

[nimzabo]

Mas deixa-me alargar um pouco o escopo da tua perspectiva: eu acho que na actualidade não se conseguem fazer filmes com pureza e a candura (a inocência fabricada on-screen) desses tempos.

Assim de repente não me ocorre nenhum contra exemplo o que não quer dizer que não possa haver.

Mas a ser verdade, será que isso tem que ver com a forma como as relações entre homens e mulheres evoluiram?
Por outras palavras, já lá vai o tempo em que as mulheres, ou o amor, eram puros?

E em relação aos homens? sucederá o mesmo ou no caso deles é diferente?

[nimzabo]

Uma diferença pode ser que as mulheres hoje se afirmam mais lutadoras e mais contestatárias.
Na vida real estou a lembrar-me de exemplos (exemplos no duplo sentido) como a Greta ou a Malala.

No cinema lembrei-me da personagem da Natalie Portman em Leon, o Profissional.
É uma miúda mas surge com mais garra do que a transparecer candura ou dignidade ou o que seja no género.

[Samwise]

Mas deixa-me alargar um pouco o escopo da tua perspectiva: eu acho que na actualidade não se conseguem fazer filmes com pureza e a candura (a inocência fabricada on-screen) desses tempos.

Assim de repente não me ocorre nenhum contra exemplo o que não quer dizer que não possa haver.

Mas a ser verdade, será que isso tem que ver com a forma como as relações entre homens e mulheres evoluiram?
Por outras palavras, já lá vai o tempo em que as mulheres, ou o amor, eram puros?

Não, e não. Categoricamente.

Quanto ao primeiro caso, foi uma questão de mistificação apenas no ecrã - um conjunto de "teatralidades" moldadas pela censura e por
autoritarismos puritanos que impediam que a realidade fosse mostrada na totalidade, e tal como era.

Em relação ao segundo caso, mulheres (e homens) e amor puro, só no paraíso, e antes da mordidela fatal.

[nimzabo]

Bem, a Audrey Hepburn não me parece a mesma coisa que uma escabriada qualquer dos tempos que correm.
Por exemplo algumas cantoras.

[nimzabo]

Antes


E depois

[Samwise]

Bem, a Audrey Hepburn não me parece a mesma coisa que uma escabriada qualquer dos tempos que correm.
Por exemplo algumas cantoras.

Certo, mas creio que comparações assim caso a caso não servem para muito. A Audrey Hepburn tinha características próprias, físicas e de personalidade, que lhe permtiam manter essa aura, se a cultivasse devidamente.

Onde estou a querer chegar é que nesses tempos havia um certo lustre artístico que era possivel manter socialmente, e que decorria apenas de uma fabricação artificial que partia da imagem mostrada pelo cinema (e que o cinema estava condicionado pela censura, e pelo puritanismo instituicional).

Haverá casos que são excepções, mas a regra era essa. IMO.

[nimzabo]

Entretanto houve uma revolução sexual, mais umas décadas de sedimentação, internet...
Não foi só o cinema que mudou.

E quem te lê fica com a impressão que o cinema terá ficado mais autêntico e menos hipócrita, isto é, melhor.
Mas será isso que aconteceu? a mim parece-me que algo se perdeu no processo.
O paraíso?

[Samwise]

Entretanto houve uma revolução sexual, mais umas décadas de sedimentação, internet...
Não foi só o cinema que mudou.

Num comentário rápido:

Concordo inteiramente, e esses processo de mudança, tendo sido contínuo, teve alguns pulos maiores pelo meio. O primeiro foi esse shift dos anos 60 para os 70 que teve pelo meio a Guerra do Vietnam (e que dever ter sido o seu maior catalizador), e depois a seguir o advento Internet, que mudou tudo, tudo, tudo - o mundo passou a "girar de forma mais partilhada". Mais recentemente, o 11 de setembro, mas a nível das artes não sei se mudou assim tanto os comportamentos sociais.

E quem te lê fica com a impressão que o cinema terá ficado mais autêntico e menos hipócrita, isto é, melhor.
Mas será isso que aconteceu? a mim parece-me que algo se perdeu no processo.
O paraíso?

Sim, ficou mais autêntico e menos hipócrita, mas não associo estas características necessariamente a "melhor" - em concreto e em particular em tudo o que respeita às artes.

Tenho sido crítico de um certo discurso de que "antigamente se faziam melhores filmes", mas sinto que estou a mudar lentamente de opinião a esse respeito.

[nimzabo]

Longford
https://www.imdb.com/title/tt0759612/?ref_=ttls_li_tt
https://www.rottentomatoes.com/m/1175778-longford
Sobre um politico inglês católico que durante décadas foi visitador prisional e o seu envolvimento no caso de um casal que assassinou várias crianças.

[José]

The Sheltering Sky - Um Chá no Deserto (1990), de Bernardo Bertolucci
https://www.imdb.com/title/tt0100594/

Fotografia belíssima, banda-sonora fantástica e intensa (da responsabilidade de Ryuichi Sakamoto) e a entrega de um excelente elenco - com destaque para a sempre espectacular Debra Winger - não conseguem esconder alguma falta de alma/foco da história que se tem em mãos. É estranha esta sensação, até porque conseguimos perceber para onde é que tudo quer ir, só que o filme nunca chega sequer a roçar os calcanhares desses objectivos. Tem a sua beleza poética e fôlego de épico, adapta a obra de Paul Bowles, mas carece de uma chama anímica; é tão imperscrutável quanto as personagens que estão em cena, não nos conseguindo envolver por completo.

[José]

Lake Mungo - O Segredo do Lago Mungo (2008), de Joel Anderson
https://www.imdb.com/title/tt0816556/?ref_=nv_sr_srsg_0

Chegando a esta altura do ano, dá-me sempre vontade de virar as atenções para os géneros de terror, thriller, suspense, etc. Já tinha ouvido falar deste ultra-discreto filme e dei de caras com ele no Youtube, onde se encontra de forma gratuita. É do género de terror, um chiller em estilo de falso documentário/reportagem televisiva sobre uma família a braços com a maior das tragédias, depois de um dia de convívio junto a um lago resultar na morte por afogamento da filha adolescente, a enigmática Alice (fica aqui a dica do apelido da personagem, Palmer, a remeter em tudo para a mítica Laura Palmer de Twin Peaks, obra que só pode ter inspirado este filme). A partir daí, estranhas manifestações paranormais começam a ocorrer na casa onde vivem e segue-se uma investigação para apurar o que é que realmente aconteceu.

Mais até do que os seus elementos de terror ou de thriller sobrenatural - nos quais se mostra muito equilibrado e competente -, este Lake Mungo é uma história muito triste e a espaços comovente sobre a perda e as várias facetas do processo de luto e a forma como tudo isto pode ser vivido de maneira distinta por cada um dos elementos da família. Não existem aqui os típicos saltos ou sobressaltos automáticos e formulaicos que inquinam este tipo de filmes; a atmosfera densa e creepy é constante e obriga-nos a estar particularmente atentos às imagens home video que nos vão sendo apresentadas, para que consigamos detectar pistas que nos ajudem a resolver o mistério em cena.

Sem ser imprescindível, cumpre os seus propósitos. É muito modesto e subtil, com um ou outro twist bem encaixado. A verdade é que me deixou em sentido até ao fim.

[nimzabo]

EDIT - A Julie Andrews caiu desse pedestal, for "corrompida" mais tarde pelo realizador seu amante...

[Samwise]

EDIT - A Julie Andrews caiu desse pedestal, for "corrompida" mais tarde pelo realizador seu amante...

https://en.wikipedia.org/wiki/S.O.B._(film)

Pela temática do filme e pela cena em topless. O realizador era o marido dela.

Não estou a ver a Audrey Hepburn a aceitar alguma vez um papel do género num filme semelhante.

Curiosamente, o Edwards também a dirigiu uns anos antes, no Breakfast at Tiffany's.

[nimzabo]

Agradecido

[José]

The Changeling - O Desvendar de um Mistério (1980), de Peter Medak
https://www.imdb.com/title/tt0080516/?ref_=nv_sr_srsg_0

Apesar de contar com uma história algo genérica, é muito competente na gestão atmosférica e tem imensa classe a seu favor. O que mais admirei neste filme do género haunted house mistery foi a sua maturidade, a elegância com que está filmado e o descartar de histrionismos de trazer por casa. Não assusta de morte nem arrepia por aí além, mas intriga o suficiente para prender a atenção. Para isso, muito ajuda a composição focada e nobre de George C. Scott, na pele de um homem no ocaso da vida, a recomeçar tudo depois de perder a esposa e filha num horrível acidente rodoviário.

Alejandro Amenábar adora o filme e inspirou-se nele para o seu The Others - Os Outros (percebe-se a influência, sim senhor; há bastantes pontos de contacto entre os dois títulos, particularmente na forma como ambos filmam as "casas malditas", os ângulos escolhidos, etc) e Martin Scorsese integrou-o na sua lista de 11 filmes mais assustadores de sempre. Calma, mestre, calma, que não é caso para tanto! Mas sim, é um título eficaz, refrescante dentro do género. Muitos anos depois, Peter Medak, o realizador, seria responsável por essa inanidade que é o Species II - Espécie Mortal II (1998).