Psicose*/Психоз (2011) - Kirill Hrestinin

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JoséMiguel
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Psicose*/Психоз (2011) - Kirill Hrestinin

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Psicose*
*Título português inexistente.
Terror/Ensaio/Experimental (87 min) - "Психоз" ("Psychosis")

Data de Estreia: 4 de Outubro de 2011 (Mundial - You Tube).
Realização: Kirill Hrestinin.

Sinopse:
O neto de uma bruxa pretende reclamar a herança da casa e propriedade da falecida, que segundo as condições do testamento dela, terá de passar 3 dias e 3 noites nessa casa. Considerado por alguns, como o filme de terror mais assustador existente. Primeira longa-metragem, com orçamento reduzido ou inexistente, do jovem cineasta russo, filme gratuito não comercializado, e apenas distribuído através da conta pessoal do cineasta, no You Tube.

Opinião:
Ora bem, este texto será muito difícil de escrever... Primeiro porque comentar um bom filme é fácil, mas comentar um filme amador, com imensos problemas de orçamento, interpretação e cenário, será um desafio. O filme tem problemas, que eu não perdoo, mas ao mesmo tempo gostei dele, e parece-me ser o protótipo de um novo sub-género de terror. Um filme inovador, que não dá tréguas, com clima assustador de tensão quase permanente e desgastante. O filme é amador e pior do que qualquer série B, mas se o objectivo do género terror é assustar, então este filme sucede lindamente.

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Filmagem muito interessante com câmera montada dentro de um caixão.

O cineasta Kirill Hrestinin, tem também uma segunda longa-metragem recente disponível na sua conta do You Tube, entitulada O Fantasma de Hovrino, que é um remake do Blair Witch Project e esse já tem qualidade de cinema, sem os problemas de amadorismo deste Psicose. Ele está neste momento a fazer um terceiro filme de terror, que irá também lançar no You Tube. Os filmes que ele coloca, têm legendas em inglês incorporadas (desenhadas) no próprio ficheiro do filme, no segundo filme estão em inglês correcto, mas infelizmente neste primeiro filme, o russo que fez a tradução oficial, tem imensos erros de gramática e vocabulário, fica aqui o aviso.

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Gostei muito desta cena, este undead depois de escavar uma sepultura, aproxima-se lentamente por trás da rapariga e léva-a arrastada pelos cabelos, para a enterrar viva. Achei isto muito bem encenado e montado, em particular a câmara montada na cova, a ser coberta de terra.

Eu ia desistindo do filme, na 2ª cena, supostamente passada num camarote de comboio, em que se vê que aquilo não é comboio nenhum. É uma coisa horrível, muito pior que qualquer cenário artificial de estúdio de Hollywood, não percebo porque ele não filmou isto num comboio verdadeiro, até porque existe uma segunda cena, passada num comboio, que é autêntica, e vemos mesmo a paisagem real, da janela. Para agravar a situação, o actor principal é o próprio realizador-argumentista, que fez um excelente trabalho de realização e montagem, e escreveu um argumento brilhante e digno dos grandes mestres da literatura gótica, do séc. XIX, mas como actor não serve. Não é preciso saber russo, para perceber que não tem jeito. Só se aproveita a interpretação dele nas cenas de pânico e stress no final do filme.

Mas tenham atenção que se o filme fosse lixo, eu não estaria a ter o trabalho de escrever este texto. Existe aqui mérito, que recompensa o espectador que tolere esta cena do comboio.

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A pior cena do filme, passada no comboio, ao início, com amadorismo de cenário, que é inaceitável até mesmo, em qualquer filme comercial de série B. A interpretação dos actores também é péssima. Aqui os espectadores precisarão de muita boa vontade e paciência para a tolerar, mas julgo que vale a pena, pois a qualidade do filme aumenta com o desenrolar da história.

O cineasta Kirill Hrestinin, é fã dos livros do Stephen King, e dos filmes de terror ocidentais. No cinema soviético era literalmente proibido o género Terror, pois o cinema era controlado pela ditadura do governo, e não existia liberdade. Eu já fui acusado/repreendido de favoritismo por não referir esta censura e opressão nas minhas críticas do cinema soviético, e ao mesmo tempo criticar a censura religiosa norte-americana, que afectou filmes como o Casablanca. Esta é uma boa oportunidade para me redimir.

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Homenagem ao cinema e literatura de terror ocidentais, que mostra o filme The Shinning, adaptação de Stanley Kubrick do livro de Stephen King, lançado no ocidente, numa época em que o género de terror era proíbido na URSS.

O único filme soviético de terror, é o Viy, que apenas foi autorizado por ser uma adaptação fiel de um clássico de literatura do séc. XIX, pelo escritor ucraniano Nikolai Gogol, contemporâneo do Edgar Alan Poe:

http://forum.dvdmania.org/viewtopic.php?f=11&t=44402

Deste modo, só após o colapso da União Soviética, em 1991, surge a liberdade para fazer um filme de terror. Posso confirmar que, às vezes estou inocentemente a ler o wikipédia de um filme soviético, e vejo lá escrito casos de cineastas soviéticos, que foram aprisionados e mortos num Gulag da Sibéria, e de outros que pediram asilo político aos EUA. Quando digo que o género de terror era proibido, antes de 1991, não estou a exagerar!

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Na primeira cena do filme, que é excelente (e antes daquela desgraça do comboio, que já referi), é notória a homenagem e inspiração do jovem cineasta russo, no cinema norte-americano. Numa única cena vejo influências do Pesadelo em Elm Street, pela canção infantil (One, Two... Freddy is comming for you), Psycho, pelos ângulos exteriores sombrios da casa, e finalmente The Shinning, pela câmara razante ao chão em movimento de aproximação à casa, ironicamente o Kubrick foi influenciado pela cinematografia soviética, quando filmou a câmera em movimento do The Shinning.

A razão pela qual eu tolerei o amadorismo dos actores e cenários, é porque sou grande fã do cinema soviético e Russo, que não pára de inovar, mesmo com o período conturbado das últimas décadas, em oposição ao comercialismo de Hollywood, que desrespeita os espectadores, segue pelo caminho errado e só tem em conta os teenagers, alvo fácil para o marketing agressivo, que sucumbe à pompa e circunstância das animações a computador, num cinema, que deixa de ser cinema e se transforma em desenho animado, sem actores e sem cenários, apenas com animações a computador, a espremer ao máximo os remakes. Tive curiosidade e expectativa, em relação a este filme, e continuei a ver, após a terrível cena do comboio, e fiz muitíssimo bem, pois a qualidade aumenta, após os personagens chegarem à casa. Apesar de todo o amadorismo, temos uma música excelente, boa cinematografia, e um belíssimo argumento original, no estilo clássico e gótico da literatura do séc. XIX.

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Esta é a cena que mais gostei do filme. A porta abre-se e entra o undead com um caixão genuíno debaixo do braço. Este actor é impecável, é um tipo sinistro, muito alto e pálido, igual aos zombies do George Romero, da Noite dos Mortos-Vivos. Vale a pena ver o filme, só por esta cena!

Volto a frisar que o filme é amador, abaixo de série B, por isso não me venham depois acusar de tentar enganar os leitores do fórum, a perder hora e meia das vossas vidas a ver "lixo". Pelo menos não há perigo de gastarem dinheiro no filme, porque nunca esteve à venda, a visualização é sempre gratuita, no You Tube, mas ainda assim a maioria do pessoal vai-se rir do filme e refilar comigo por eu o divulgar, bem mas se for o caso de não gostarem, porque não aproveitar um serão em casa com os amigos, para beber umas cervejas e rirem-se do filme em contexto social? Mais ainda, se quiserem assustar algum familiar ou amigo, que seja medroso de filmes de terror, este é o filme mais brutal que já vi, mete a um canto aquele mítico terror do cinema japonês das histórias de fantasmas.

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Belíssima cena, filmada do ponto de vista de um tipo deitado na cama, que acorda e vê estas figuras sinistras aos pés da cama, dentro do quarto... :twisted:

Em suma, as palavras de ordem aqui são Gótico, Sinistro, Macabro, Inovador, Original, Experimental, Amador, Assustador e Terror constante e desgastante, este não é um filme convencional de terror, que tem 3 ou 4 cenas assustadoras, e o resto é telenovela, para encher chouriço, este filme não pára e não dá tréguas, no clima sombrio e fantasmagórico. Tenho pena que seja um filme amador, sem meios e actores decentes, mas a fórmula está lá toda, à grande e à francesa, ou talvez deva antes dizer ao estilo do pioneirismo do cinema russo.

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O livro dos mortos é um álbum de fotografias, da bruxa. Na última página estão as fotografias dos protagonistas. :wink:

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Gosto do sentido de humor russo, o protagonista explica à irmã da namorada, que a casa é antiga e não tem casa-de-banho, mas existe uma latrina na rua. O filme foi filmado em genuínas condições do mítico inverno russo, nota-se pelas árvores sombrias desfolhadas e bafo a sair da boca dos actores. Gostei da autenticidade da casa, com janelas antigas duplas, são de madeira podre mas com vidros duplos, nós em Portugal só temos vidros duplos, nas modernas casas de luxo, e escritórios. Na rússia o frio é tanto, que já usavam o sistema há séculos. Mas tirando as janelas, esta é uma casa portuguesa com certeza! -bullshit- Portuguesa não é, mas podia ser qualquer casa antiga das nossas aldeias, até o banquinho de pedra/tijolo caiado está lá, bem como as viúvas da aldeia que se vestem de preto até ao fim da vida... Um pouco da cultura europeia, que não se vê no cinema de terror japonês ou anglo-saxónico... fica sempre bem... acho eu...

E finalmente o link You Tube, com a versão oficial do filme:



Se quiserem dizer mal do filme, directamente ao cineasta, podem fazê-lo lá, pois ele responde pessoalmente aos comentários... Se quiserem agradecer ele ter oferecido o seu filme gratuitamente a todo o mundo, também não fica mal...Eu apoio estas iniciativas amadoras de fazer cinema com gosto, sem fins lucrativos. Este texto que escrevi foi a forma que encontrei de apoiar o cineasta, e a iniciativa dele. Acabei de escrever a primeira crítica cinematográfica do mundo ocidental ao filme, pois não existe nenhuma em inglês ou noutra língua ocidental que utiize o alfabeto romano, esta é a primeira! O filme não consta no IMDB ou wikipédia, apenas nos equivalentes russos ao IMDB. Eu bem tentei pesquisar o filme no google, mas foi chapéu, teve de ser à força bruta, com auto-tradução do google chrome e com alfabeto cirílico, e mesmo assim foi difícil.

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